Qual é o caminho para o museu? Onde posso comer bem?
Feitas pelos turistas, as duas perguntas constituem, na maior parte das vezes, os únicos e breves contactos com os habitantes locais. Na Universidade de Aveiro (UA) uma equipa de investigadoras demonstra que quanto maior e melhor for a interação entre residentes e turistas, maior será a influência positiva do turismo na qualidade de vida dos locais e, por isso, melhor serão aceites os visitantes. Mas em Portugal muito ainda há para fazer.
Publicado no Journal of Quality Assurance in Hospitality & Tourism, o estudo foi realizado pelas investigadoras Maria João Carneiro, Celeste Eusébio e Ana Caldeira, do Departamento de Economia, Gestão, Engenharia Industrial e Turismo e da Unidade de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) da UA, e envolveu um inquérito a habitantes de duas estâncias balneares do litoral centro português. As conclusões são, no entanto, replicáveis em todo o país.
“O estudo demonstra que quanto maior é a interação entre residentes e visitantes e mais satisfatória é essa interação, mais positivos tendem a ser os impactes do turismo na qualidade de vida dos residentes”, aponta Maria João Carneiro.
De facto, o trabalho das investigadoras revela que “a influência da interação entre residentes e visitantes na perceção dos primeiros sobre os impactes do turismo na sua qualidade de vida se explica, não só pelo vislumbrar de oportunidades económicas decorrentes dos contactos, mas por uma mudança de perspetiva mais abrangente no residente, que afeta diversos domínios da sua qualidade de vida”.
Oportunidades socias e económicas
“Um contacto mais intenso e satisfatório com o visitante permite aos residentes obterem um maior conhecimento e compreensão da sua cultura e das suas atitudes, desenvolverem sentimentos mais positivos e atitudes mais favoráveis relativamente aos turistas e ao próprio desenvolvimento turístico e, até, terem uma maior recetividade a impactos turísticos menos positivos”, descreve Maria João Carneiro.
A valorização dos visitantes por parte dos residentes pode, por outro lado, contribuir também para uma maior perceção de efeitos positivos do turismo ao nível de maiores oportunidades de socialização e recreação.
Apesar dos resultados, os estudos internacionais sobre o tema revelam que a interação entre residentes e visitantes é ainda escassa, breve e formal, restringindo-se muitas vezes a solicitações de informações e a interações durante a compra de produtos e fornecimento de serviços. Neste cenário, aponta Maria João Carneiro, “Portugal não é exceção, apresentando ainda oportunidades relativamente limitadas de interação entre residentes e visitantes”.
Precisa-se de mais e melhor interação
“A promoção de mais encontros enriquecedores entre residentes e visitantes poderia certamente contribuir para reduzir os conflitos entre estes dois intervenientes na atividade turística, bem como para gerar nos habitantes locais perceções mais positivas relativamente ao turismo e, simultaneamente, atitudes mais favoráveis relativamente ao desenvolvimento da atividade turística”, desafia a investigadora.
A estruturação de eventos que promovam o contacto entre residentes e visitantes e a integração de residentes no desenvolvimento e fornecimento de serviços turísticos, são algumas das pistas que Maria João Carneiro lança aos agentes responsáveis pelo desenvolvimento turístico.
“Este tipo de ações pode também ser muito relevante para os residentes, não só pela compensação económica que poderão obter, mas também pela ligação que podem manter a um património que valorizam e do qual se orgulham”, diz. Outro aspeto valorizado neste tipo de interações são “as oportunidades de alargar a rede de conhecimentos e contactos dos residentes, algo particularmente valorizado em destinos do interior, onde a falta de acessibilidade contribui para o isolamento das populações”.
Bons exemplos são ainda escassos
Há já atualmente alguns exemplos em que o contacto próximo entre residentes e turistas é promovido e valorizado. “Em alguns museus os visitantes são já convidados a desenvolver parte de algumas atividades conjuntamente com residentes e em alguns eventos os visitantes são estimulados a participar na preparação do evento com os residentes”, descreve Maria João Carneiro.
Também no âmbito de alguns empreendimentos de turismo rural “os visitantes são recebidos pelos próprios proprietários, sendo estimulado o convívio entre estes e uma exploração do destino com a ajuda preciosa dos residentes”. Outro bom exemplo da promoção de interações vem de Guimarães, mais precisamente do tempo em que a cidade foi Capital Europeia da Cultura. Nesse período alguns residentes receberam músicos e visitantes na própria casa. “Estes são apenas alguns exemplos, entre vários outros que valeria a pena estudar”, aponta Maria João Carneiro.
“Desenvolver estratégias que promovam encontros enriquecedores e apreciados por residentes, mas também por visitantes, afigura-se, assim, um importante contributo para o desenvolvimento dos destinos turísticos, uma vez que a satisfação de todos os stakeholders é crucial para assegurar a sustentabilidade desses destinos”, aponta Maria João Carneiro. A investigadora salienta ainda o peso que as interações entre residentes e visitantes têm também na qualidade de vida dos visitantes, aspeto já realçado em alguns estudos, mas que carece ainda de uma investigação mais aprofundada.
Créditos: Investigação da Universidade de Aveiro
Investigadoras Maria João Carneiro, Celeste Eusébio e Ana Caldeira.
Universidade de Aveiro
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